Ir. Dorothy: uma vida pela vida
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“Vidas pela vida. Vidas pelo Reino”. O trecho dessa canção que marca a caminhada eclesial na América Latina resume bem a missão de Dorothy Mae Stang, uma freira norte-americana que, desde jovem, optou pela causa dos mais pobres. A religiosa foi assassinada no dia 12 de fevereiro de 2005 em Anapu, no estado do Pará, por causa de sua luta em favor dos pobres e da terra. Passados 20 anos após o acontecido, vale a pena fazer memória de sua vida e missão.
Ir. Dorothy nasceu em 1931 e, em 1966, veio para o Brasil. Pertenceu à Congregação das Irmãs de Notre Dame de Namur. Essas religiosas desenvolveram vários trabalhos com os camponeses migrantes, os indígenas e as camadas populares. A luta pela vida plena a partir da prática evangélica com o povo da região amazônica marcou o itinerário de Ir. Dorothy. Apesar de ter nascido nos Estados Unidos, chamava o povo da Amazônia de “nosso povo”.
Motivada pelo Evangelho, ela sempre desejou exercer sua missão entre os pobres mais pobres. Em 1982, ela foi trabalhar na pequena localidade de Anapu (PA), cortada pela rodovia Transamazônica. O contexto marcado pela ganância de madeireiros e fazendeiros empenhados em explorar a floresta e as pessoas que nela viviam tocaram a sensibilidade humana e cristã da religiosa, levando-a a inserir-se no conflito fundiário da região.
A pequena vila era formada por retirantes, em sua maioria nordestinos, afligidos pela precariedade do trabalho assalariado nas fazendas de gado, pela pobreza extrema, pelas doenças e pela falta de perspectivas de vida. Em outras palavras, um povo sobrecarregado, ferido e silenciado. Alguns dos atributos próprios de uma “pastoral em saída” é a vitalidade, a esperança e a força criativa. Foram essas as sementes que Ir. Dorothy semeou naquela terra. Plantou a vida onde havia morte e violência.
Somente um amor profundo por Jesus Cristo e um compromisso sério no seu seguimento pode fazer alguém abraçar a mais nobre de todas as causas: o Reino de Deus! Foi por causa desse certo Reino que Ir. Dorothy cumpriu seu ideal missionário conjugado com os desafios políticos e sociais da região onde trabalhou. Ela sabia que não podia ser omissa diante das injustiças sociais e ecológicas da Amazônia.
Marcada por uma profunda espiritualidade, ela entendeu que o cristianismo se faz no serviço aos pobres e esquecidos. E isso lhe custou o derramamento do próprio sangue. A freira não possuía armas. Também não possuía o poder econômico dos grandes, tantas vezes edificado com o sangue e o suor dos pequenos, escravos do latifúndio. Por causa da fidelidade ao seu ideal, ela foi assassinada com seis tiros à queima-roupa, a mando de fazendeiros da região.
Podemos dizer que, assim como tantos outros padres, freiras e leigos que, em nosso país, deram a vida pela causa dos pobres e da terra, Ir. Dorothy figura entre os mártires da ecologia integral. Na Laudato Si’, o Papa Francisco convida a uma conversão integral, entendendo que a ecologia se faz escutando o grito dos pobres e da Terra.
Ir. Dorothy amou os pobres, mas também a amou a terra que Deus criou, a “Casa Comum” que implora por mais cuidado e atenção. Foi uma profetisa de coração aberto, de ouvidos atentos e de mãos estendidas. Seus pés a caminho nos mostram que ela continua presente com sua mística e sua esperança. Ela não morreu. Foi martirizada, mas continua presente na caminhada de todos os homens e mulheres que têm os pés firmes no chão e o coração aberto à vida plena sonhada por Deus!
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