Ary Albuquerque

A mesa era comprida e repleta de companheiros. O mais novo beirava os noventa anos. Um autêntico festival de maioridade. Os gestos e as vozes arrastadas comandavam o espetáculo. Mas todos ali prestigiavam o amigo, conversando entre si. As falas, na maioria das vezes, eram desconexas. Uns entendiam, outros faziam entender, e outros nem ligavam, ficavam alheios – sinais evidentes de senilidade. E a festa continuava.
A orquestra tocava músicas antigas e altas, porém, para eles, o som estava normal. Na hora de cantar os parabéns, o “encarregado” esqueceu de trazer o bolo e as velas. Mesmo assim, cantaram num vozeiro desafinado e fraco. Esqueceram de levantar um brinde ao aniversariante. Tudo bem, o incidente foi relevado pelo dono da festa.
O aniversariante, ainda lúcido e jovial, tomou a palavra e fez um belo e comovente discurso de improviso. Os músicos e os garçons choraram, enternecidos com a bela oração. Os convidados não. Muitos não perceberam que o anfitrião estava agradecendo a presença de todos e por estar completando cem anos com saúde e lucidez.
Ninguém completa um centenário de vida impunemente, principalmente, quando os seus convidados são idosos e caquéticos. É provável que aconteçam imprevistos. Foi teimosia do aniversariante. Ele quis comemorar duas vezes: uma com amigos de infância e outra com familiares.
A alegria do mundo é a juventude. Em toda festa, mesmo que seja de idosos, é preciso ter a presença dos jovens, pois são eles que dão colorido e graça à festa. Deu no que deu. Mas, com idosos não se discute – faz-se a vontade ou não se faz, eis a questão…

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