A quaresma e a prática do silêncio

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“Ó dialeto de minha aldeia interior, doce falar de meus campos imaginários, jargão ribeirinho de meu rio invisível (…)”. É assim que o autor belga Jean Mogin se refere ao silêncio em seu livro Pastagens de Silêncio.
Nesse período quaresmal, tempo sóbrio em que a Igreja se veste de roxo, é necessário e salutar que se reflita mais sobre o silêncio, essa prática pouco usual para a ruidosa modernidade. Afastando-se do silêncio, consequentemente, o mundo afasta-se de Deus, pois Ele fala e age no silêncio.
Esse problema dos intermitentes barulhos, ruídos e vozerios têm atacado até mesmo as nossas igrejas. Está cada vez mais difícil escutar a voz do silêncio quando se adentra em um templo santo. Nossas missas e celebrações tem sido barulhentas por demais e nem mesmo na quaresma, quando os cânticos deveriam ser mais sóbrios, com poucos instrumentos, o silêncio é valorizado.
Daí fomenta-se a necessidade de exercitarmos a espiritualidade do silêncio, de experimentarmos a fecundidade do silêncio, da calma, do diálogo consigo mesmo. É necessário carregarmos conosco um convento interior, onde possamos nos refugiar dos barulhos do mundo e encontrar Deus nos recônditos da alma.
Nesse sentido, a espiritualidade da quaresma é um convite à oração interior, a esse voltar-se para si mesmo, a esse mergulho no imenso mar de nosso ser. Quando paramos para meditar e sentir a pulsação do coração, no silêncio e na solidão, facilmente atingimos a nossa essência divina. O coração é realmente a morada de Deus, o templo do silêncio.
Mas parece que a oração silenciosa nos incomoda, nos inquieta, pois estamos submetidos à ditadura do ruído, do barulho mundano. A solidão parece desesperar o homem moderno e nos esquecemos que é nela que melhor falamos a Deus e escutamos sua voz.
O cardeal Robert Sarah reflete sobre esse tema no livro A força do silêncio e afirma: “Revestindo-se de silêncio, como o próprio Deus habita em um grande silêncio, o homem está perto do céu, ou melhor, ele deixa Deus se manifestar nele. (…) A voz de Deus é silenciosa”.
Portanto, a quaresma quer nos inserir nesse silêncio sagrado e nos fazer descobrir sua força e sua fecundidade no processo de conversão para Deus. Em casa ou nas igrejas, precisamos ter orações menos barulhentas que favoreçam a harmonia interior, o transcender da alma. O silêncio é a rota segura que nos permite trilhar intensamente o caminho quaresmal.

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