Criação da UVA e a história que não foi contada

FÁTIMA MOURA
Quando a Universidade Estadual Vale do Acaraú fez quarenta anos, procurei ouvir algumas pessoas que simbolicamente fertilizaram a semente da UVA, vivenciaram a chamada fase de germinação da instituição. Na oportunidade, padre Sadoc de Araújo, fundador da instituição foi um dos entrevistados, mas o texto nunca foi publicado. Agora, com a aproximação do aniversário da Universidade (23 de outubro), achei oportuno levar ao conhecimento público as informações colhidas há exatos 11 anos.
Na época, estava muito em voga questionar o porte da UVA e seu grau de importância no contexto que se insere. Quando questionado a esse respeito, padre Sadoc respondeu que uma instituição deste porte no interior nordestino só pode ser comparada a outra instituição no mesmo contexto. Qualquer paralelo, fora deste parâmetro, será de extrema inutilidade, já que estamos nos referindo a um cenário específico, com toda uma teia de abordagem incluindo aspectos geográficos, humanos, político, social e econômico. “Para não nos distanciar da abordagem proposta vamos falar da Universidade Estadual Vale do Acaraú desde sua fase embrionária”, reforçou, ele.
Padre Sadoc, com autoridade de fundador e primeiro reitor da UVA, informou que por volta de 1967 foi ao Rio Grande do Sul fazer um curso para a instalação de uma biblioteca nos dependências do Seminário São José. Lá conheceu a Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), uma instituição privada jesuíta localizada na cidade de São Leopoldo, na Região Metropolitana de Porto Alegre. Quando retornou a Sobral, o seminário havia fechado. Então ficou pensando como seria, dali em diante, o ambiente antes tão movimentado, que naquele momento estava ocioso, praticamente abandonado. “Numa das noites insones, enquanto observava pela janela a revoada os morcegos(risos), na madrugada, me veio a ideia da fundação de uma universidade para dignificar o espaço idealizado por Dom José”, narrou.
Como surgiu o nome desta universidade? “Ora, se o nome da universidade Gaúcha é Universidade do Vale do Rio dos Sinos, por ter sido implantada na região do Vale do Rio dos Sinos, Sobral fica no vale do Acaraú, então, a instituição receberá o nome de Universidade do Vale do Acaraú”, pensou o fundador. O período em que antecedeu a instituição da UVA, já funcionavam dois cursos de nível superior, em Sobral: a Faculdade de Filosofia e o curso de Ciências Contábeis. Com a Fundação Municipal, foram criadas a Faculdade de Enfermagem e Obstetrícia, a Faculdade de Educação e a Faculdade de Tecnologia da Construção Civil, como instituiu a lei Municipal de 23 de outubro de 1968, na gestão do então prefeito Jerônimo Medeiros Prado. Em 10 de outubro de 1984 a UVA foi encampada pelo Estado e reconhecida pelo Conselho de Educação do Ceará em 31 de maio de 1994.
Outra pessoa que na ocasião procurei conversar sobre o início do funcionamento da UVA foi Ivanilde Ferreira Lima, auxiliar de serviços gerais que morou nas dependências do campus Betânia, esposa seu Cícero de Lima(oficial de manutenção. Ela informou ter trabalhado, desde o inicio do funcionamento da UVA, em parceria com dona Mirian Maia Guersch – parte da personificação desta universidade, pois seus colegas diziam ser ela a cara da UVA ( faleceu em maio de 2005). A professora Mirian teve atuação pedagógica e administrativa significativa. Ivanilde conta que dona Mirian, bem no comecinho da UVA, cuidava de tudo, até da cerimônia de colação de grau. Depois de reuniões com os formandos, organizava toda papelada do DEG( Departamento de Ensino de Graduação, e “ela mesma fazia uma trouxa com toalhas, becas, cortinas para eu lavar no rio. Quando eu voltava nós duas passávamos a ferro a roupa toda. Ela era assim: quando o trabalho aparecia dava conta mesmo, esquecia que era professora, que tinha outros cargos importantes e fazia as coisas acontecerem”, relembra, Ivanilde.
Outra funcionária antiga que endossa os depoimentos anteriores é dona Zenith Carneiro, responsável pela capela do Preciosismo Sangue na Betânia. “Foi assim mesmo. Acompanho a trajetória da UVA desde os tempos do padre Sadoc. Para mim é gratificante ver a universidade chegar onde chegou, com esforço de muita gente”, destaca, ela.
Ouvi pessoas de diversos escalões da Universidade, por entender que o desenvolvimento de uma instituição resulta do empenho de muitas pessoas, sem distinção de cargo ou função. Todos são peças de uma mesma engrenagem, na execução de uma mesma obra. Para reforçar esta posição, trago aqui um registro de puro reconhecimento. Em 1991 o Theatro José de Alencar, foi reformado na gestão de Violeta Arraes, na Secretaria de Cultura do Estado. Na reinauguração, a cerimônia de abertura contou uma espécie de orquestra sinfônica com a participação dos operários que trabalharam na reforma, produzindo com martelos, serrotes, colheres, limas e pás, uma apresentação de sons tirados destas ferramentas como se fossem instrumentos musicais. Um ato bonito, coeso, simbólico, significativo.
Há 50 anos, representantes dos mais variados setores da UVA, alunos, professores, servidores administrativos, auxiliares de serviços gerais, oficiais de manutenção, gestores, analistas, diretores de Centro, coordenadores de Curso, também orquestrados, produzem um “som” que precisa ser ouvido, registrado, reconhecido e difundido como empenho coletivo.



