lampeiao

Lucas Monteiro Barbosa – seminaristalucas18@gmail.com
Por muitos anos, propalou-se uma icônica pergunta: “Lampião, bandido ou herói?”. Independentemente de opiniões e, sobretudo, descobertas históricas, Lampião é um dos personagens mais ilustres da história brasileira. Sendo o brasileiro mais biografado e o segundo entre os latino-americanos, Virgolino, representando todo o cangaço, é um fato que não passa despercebido nos anais brasileiros. No Nordeste, Lampião não somente é personagem, mas é um dos alicerces da cultura. Isso se dá por vários motivos que não caberiam em um único artigo. Em todo caso, não é trabalho dos pesquisadores enaltecer ou desqualificar Lampião, mas mostrar sua verdadeira história, mostrar o homem antes do mito.
Apesar de algumas incongruências, a maioria dos pesquisadores e, sobretudo, as maiores autoridades consideram o 04 de junho de 1898 como a data real do nascimento de Virgolino Ferreira da Silva, o Lampião, como consta em seu batistério. De fato, o sertanejo do século XIX levava muito a sério as coisas sagradas do catolicismo, e em se tratando de um documento que comprova o sacramento de batismo, é mais aceitável que não haja equívocos, a despeito da diferença da data que consta na certidão de nascimento. Lampião não é o único a ter essa diferença nos registros. Em todo caso, o menino Virgolino, filho de José Ferreira dos Santos e Maria Sulena da Purificação – mais conhecida por Maria Lopes – nascera no sítio Passagem das Pedras, às margens do riacho São Domingos, na zona rural de Vila Bela, atual Serra Talhada – PE. Seu nome, um tanto incomum para os dias hodiernos, fora uma sugestão de amigos do pai, que tiraram do Lunário Perpétuo, um livro bastante comum naquele tempo. Da constelação de Virgo, saiu a inspiração para Virgolino.
Fora criado alguns metros depois da casa dos pais, com a avó materna, dona Jacosa. Virgolino fora o terceiro filho do casal, cuja prole conta-se ao número de nove filhos biológicos e um de criação. Apesar da simples região rural envolta pela caatinga, a família Ferreira não era propriamente uma família pobre. Enquadravam-se na categoria dos proprietários de terra. No sítio onde viveu, o menino Virgolino aprendera, com destreza, muitas ocupações: vaqueiro, almocreve, artesão, amansador de burro bravo, dentre outras. Como criança, não deixara suas rotinas infantis nas brincadeiras. Alguns metros do sítio Passagem das pedras morava a família Barros, na fazenda Pedreira. José Alves de Barros, o Zé Saturnino, que viria a ser o primeiro inimigo de Lampião, era um dos filhos de Saturnino Alves de Barros. Quando crianças, ambos brincavam naquelas redondezas.
Muito religiosos, os pais de Virgolino lhe transmitiram as devoções e o credo católico. O que o menino levará em sua vida até a morte. Eram devotos do padre Cícero. Em 1915, na lancinante seca, com exceção do filho mais velho, Antônio, a família Ferreira ruma a Juazeiro do Norte a fim de se unir a tantos outros romeiros em oração pelo fim da estiagem. Foi no retorno da terra do “Padim” que começou a contenda entre as famílias Ferreira e Barros. Um dos empregados da família Barros, Zé Caboclo, havia roubado alguns carneiros da família Ferreira. A ausência de punição a este empregado suscitou uma irreversível rixa entre as famílias. Em dezembro de 1916 houve o primeiro tiroteio, no sopé da Serra vermelha. A família Ferreira fora expulsa de suas terras pelas autoridades de Vila Bela e passara a viver na fazenda Poço do Negro, próxima à vila de Nazaré, em Floresta – PE.
A partir de então, alguns dos Ferreira aderiram à vida de cangaceiros. Liderados por um dos tios, Antônio Matilde, os Ferreira montaram um pequeno grupo, os três filhos mais velhos, Antônio, Livino e Virgolino eram os mais temidos. Só em 1922, após a morte dos pais, os irmãos mais velhos agregaram-se definitivamente ao bando se Sinhô Pereira, que já em 1918 financiava, com mão de obra, os Ferreira contra os Barros. Peremptoriamente, Virgolino e seus irmãos mais velhos adentraram na vida errante do Cangaço, Virgolino passa a ser apelidado de Lampião e no mesmo ano de 1922 assume a chefia do bando, incumbência dada pelo próprio Sinhô Pereira, que largava o cangaço por orientação do padre Cícero. Não tardou muito para Lampião passar a ser noticiado em todos os jornais do Brasil e até no exterior. O apogeu de seu “reinado” fora o ano de 1926.
A fama de Lampião o transformou em um mito na cultura do Nordeste, ainda hoje ele está presente no imaginário popular. Contudo, apesar de ter sido, em seu tempo, um bandido, é necessário, antes de tudo, compreender a conjuntura cultural na qual ele e todo o fenômeno do cangaço estão inseridos. Somente assim, pode-se descartar os preconceitos que amiúde se fazem por falta de informação histórica e, sobretudo, da rica cultura nordestina.

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