Adaptações e desigualdade do ensino na pandemia
As escolas e universidades tiveram que respeitar as medidas de isolamento e criar um novo canal de comunicação que atendesse as necessidades dos estudantes
Por Priscila Duarte
Com a pandemia do coronavírus, o isolamento social fez com que o modelo padrão de educação presencial se reinventasse. As escolas e universidades tiveram que respeitar as medidas de isolamento e criar um novo canal de comunicação que atendesse as necessidades dos estudantes. Do outro lado, pais e alunos estão conhecendo um novo método de ensino e criando o ambiente escolar na sala de casa.
No imaginário da estudante do curso de Jornalismo, Liana Mesquita, a apresentação do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) seria na sala de aula com direito ao acolhimento dos amigos. Mas foi em um cômodo de casa através de uma vídeo chamada que a estudante, agora recém formada, qualificou o trabalho. “A princípio eu detestei a ideia. Apresentar online ia perder toda a emoção e a sensação de estar lá em sala com os amigos. E outra, ou era online ou eu ia atrasar mais um semestre, dai eu apertei os pontos e dei continuidade”, ressalta a aluna de uma universidade privada.
Liana relata que por causa da pandemia, os encontros com o orientador do projeto foi realizado através da plataforma google meet. Além disso, a sua revista ‘Correio Feminista’ que tem como pauta a representatividade da mulher, sofreu alguns ajustes pela dificuldade de fotografar e entrevistar as pessoas de forma presencial.
Há três meses, Evelline Silva tenta conciliar a rotina de casa e as aulas remotas dos filhos Ezequiel, 11 anos, e Valentina, 6 anos. Evelline elogia a consciência do filho mais velho sobre a importância do distanciamento, mas ressalta a saudade que ambos sentem do ambiente escolar. “O ambiente da escola é agradável, os amigos, as brincadeiras e creio que eles sentem falta do ambiente de estudo, dos amiguinhos que ele tem mais afinidade”, disse.
Já em questão de adaptação e aprendizagem, o pequeno Ezequiel assiste quase cinco horas de aulas diárias pelo computador e parece determinado em aprender a lidar com trabalhos, provas e até olimpíadas sem o auxílio presencial do professor, enquanto Eveline relata a irritação da caçula com o isolamento acompanhado do ensino domiciliar. “A maior dificuldade do Ezequiel é o acesso a plataforma, devido a conexão que as vezes dificulta, mas ele não está apresentando dificuldade com as aulas remota, mas ela, por ser infantil, está sendo a maneira que eu repasso a tarefinha pra ela. Ela tinha uma maneira com as tias e comigo está sendo um pouco diferente. E por ser criança, a concentração não é total”, explica.
Eveline e os filhos enfrentam desafios mas com a realidade de uma escola privada. Apesar de ser o ideal nesse momento de pandemia, o método do ensino domiciliar não é igualitário.
Essa questão reflete na realidade de Maria do Nascimento, mãe de dois estudantes da escola pública, ela cita a dificuldade da filha Tainara, 12 anos, para acessar o link da aula online. “Foi criado um grupo aí sempre tem umas lives, acho que para conversar com o aluno, mas no celular não dá. Aí ela só faz o dever e manda pro grupo”, conta.
Maria trabalha em uma fábrica de calçados cuja atividades já foram retomadas, por isso, agora a função de ensinar o pequeno Davi, 5 anos, fica por conta da mais velha. As crianças de Maria não têm acesso as aulas online, e o único vínculo dos filhos com a escola é através de um grupo de WhatsApp criado pelo professor de cada turma para enviar a tarefa escolar. “A professora manda aí eu envio para o whatsapp de uma amiga, aí ela tira na impressora dela as tarefas dele”.
Segundo a professora do ensino superior público, Débora Aguiar, as aulas remotas excluem os alunos que não têm acesso a computadores e a conexão de internet. “Nossos alunos têm dificuldades que vão além da falta de acesso. Se desse um computador para cada um ainda teria a limitação do não saber usar. Vários dos meus alunos não sabem enviar nem e-mail. Fora a ansiedade desses dias”, diz.
“Em relação à orientação, a gente realizou algumas chamadas de vídeo e outras orientações foram por e-mail mesmo, no processo de dar o feedback do trabalho em construção. A qualificação não foi como elas desejavam pelas limitações em relação à internet também. Acabaram gravando vídeos para a banca e recebendo o feedback por parecer, em vez daquele momento presencial de discussão sobre o trabalho que é muito rico para o estudante”, explica.
A professora de Psicologia relembra que só foi possível a conclusão do TCC desses alunos porque 75% da disciplina tinha sido de forma presencial e considera que, se a universidade optar pelas aulas remotas, os alunos não terão o mesmo privilégio.