Um sonho de 200 anos
Ao celebrarmos o bicentenário da Independência do Brasil, precisamos pensar na grande nação que formamos. Grande em todos os aspectos, em território, em população, em riquezas, em potenciais, em bens naturais. Mas o que mais carecemos, no atual contexto, é de grandes ideais. Isso porque a dignidade do povo brasileiro tem sido constantemente ameaçada pelas graves crises que temos enfrentado.
É necessário, pois, alimentar novamente o sonho da independência. Um sonho que já conta duzentos anos, mas que precisa ser efetivado nesta nossa grande nação. Independência pressupõe soberania. Mas como podemos ser soberanos se uma grande parte das riquezas nacionais escoam para fora do país? Como podemos ser independentes se o nosso povo continua sujeito a uma economia que mata?
De fato, precisamos celebrar esses duzentos anos de independência renovando a consciência de que temos muitos desafios a enfrentar, muitos caminhos a serem refeitos. É lamentável percebermos o cenário de tantas desigualdades, enraizadas em nossa história e aprofundadas pelo capitalismo selvagem, no momento em que o Estado torna-se incapaz de regular a relação entre capital e trabalho.
As consequência que estamos vendo são as piores possíveis. O aumento da pobreza, o desemprego em níveis alarmantes, a perda dos direitos trabalhistas, os descuidos com nossos bens naturais. E o pior de tudo: a fome. Segundo os relatórios da ONU, atualmente, são mais de 60 milhões de brasileiros que enfrentam algum tipo de insegurança alimentar. Reafirmar a independência do Brasil é reafirmar que a alimentação é um direito inalienável.
É também reafirmar o ideal de um estado de bem-estar social, que tenha um compromisso com a promoção humana, com a defesa da vida, com a proteção de nossas florestas, dos povos originários, ameaçados pelo extrativismo predatório feito pelas grandes empresas. É a vida sendo ceifada pela ganância de uns poucos.
É reafirmar o compromisso com uma sociedade harmoniosa e pacífica, contrária à violência e à flexibilização do uso de armas. Como diz Dom Orlando Brandes, arcebispo de Aparecida do Norte-SP, a pátria amada não pode ser uma “pátria armada”! Diante de tudo isso, sonhamos com a paz, fundada na justiça, no amor, na liberdade, na garantia de direitos e no bem comum. É tempo de renovar o sonho antigo e atual da promoção da vida e de um Estado que garanta terra, teto e trabalho a todos os brasileiros. E assim, o nosso grito de independência, duzentos anos depois daquele proferido às margens do Ipiranga, é hoje um grito de esperança. Esperança na democracia, na ecologia integral, na vida, na educação, na igualdade, na dignidade humana. Esperança em um povo capaz de construir a própria história vivendo em uma nação independente e soberana.