Ary Albuquerque

A ORQUESTRA

Os pais eram amigos. Estudaram juntos no mesmo Seminário. Ordenaram-se no mesmo ano. Muito amigos. A amizade mais do que irmãos. Foram desempenhar o sacerdócio  em cidades  vizinhas. Telefonavam- se diariamente, tal o grau de empatia.
Padre Zezinho ficou lotado numa paróquia maior, cidade desenvolvida. Padre Afonsinho, numa cidade menor, mais calma. Mas, nem por isso, queixavam-se, pelo contrário, aceitaram felizes da vida.
Zezinho, devoto fervoroso de São Francisco de Assis, amava os pássaros, rios, vegetação campos, tudo que fosse natureza. Possuía um desvelo  grande  pelos pobres. Achava que o humano pecava por falta de oportunidade para praticar o bem. Desde que o ensinasse cedo, exemplificando-o, jamais, trilharia pelo caminho errado.
Afonsinho, seguidor de Santo Agostinho, é tanto que seu livro de cabeceira CONFISSÕES era de autoria do próprio. Acreditava que o MAL advinha do homem, pois, Deus lhe deu livre arbítrio, e, num ato de desobediência ele praticava ações malévolas. Deus é puro, criou o mundo só com coisas boas.
A cidade de Zezinho possuía uma orquestra, formada pela juventude paroquiana, orgulho da cidade.A orquestra  exibia-se, aos domingos, depois das missas, no coreto  da Praça  em frente  à  igreja.
A maioria dos jovens da orquestra namoravam-se, e, a licenciosidade grande entre eles. Padre Zezinho, então, convencionou chamar cada ato libidinoso e impróprio com uma ação praticada na orquestra. Por exemplo: beijos ardente na boca por tocar flauta.
Os adolescentes que praticassem beijos na boca, de agora por diante, falavam que TOCARAM  FLAUTAS, e, assim por diante…
Acontece que, Vossa Reverendíssima, Senhor Bispo Regional, resolveu fazer um rodízio entre os párocos de sua região para treinar e melhor aquilatar o trabalho  dos mesmos, permutando  de paróquias  Zezinho e Afonsinho.
Eles ficaram felizes, pois, o Bispo escolheu a permuta entre suas cidades, não  haveria problema nenhum de dissertar  sobre os pontos positivos  e negativos  de casa cidade, estavam em casa.
E, assim foi feito. Uma semana antes da data aprazada, passaram o dia reunidos e aceitaram todos os detalhes.
Afonsinho notou que a juventude da  paróquia  do seu amigo era muito santa , pois, induzia como  pecado  TOCAR FLAUTAS, TROMBONE, SAXOFONE, CLARINETE e outros instrumentos.
Ficou de perguntar ao seu amigo, mas, o tempo o impediu.
Primeiro domingo de missa na nova paróquia. Seis horas da manhã Afonsinho recebe um telefonema aflito de padre Zezinho, relatando seu esquecimento.  A missa era às sete horas. Padre Afonsinho tinha uma hora para impedir que aqueles jovens comungassem pecadores.
Afonsinho riu da engenhosidade da idéia do seu amigo, e, disse que, podia deixar.
Ele arranjaria uma maneira de impedir que os participantes da orquestra  recebessem  a Eucaristia  aquele domingo.
Imediatamente, se dirigiu a sacristia e redigiu a seguinte nota que antes da comunhão:
“ Atenção, Atenção  Pessoal da Orquestra”
Por motivo de interpretação de linguagem das músicas que estavam previstas para serem  executadas  hoje, fica adiada para a próxima  semana  a exibição  da orquestra, e, conseqüentemente, de sua comunhão  coletiva.
A moçada ficou sem entender, mas, foi a única solução inteligente e prática que o padre Afonsinho encontrou para coibir que jovens em pecado recebessem naquela manhã de domingo.
Não precisa falar que no primeiro encontro pessoal que tiveram depois do incidente, comentaram o fato entre gostosas rosadas…

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *