Entre as muitas expressões e canções que criou, Padre Zezinho cunhou a expressão “paz inquieta”, nos anos 1970. Apesar de ser pouco popular entre os católicos, essa forma de viver em paz deve fazer parte do nosso compromisso com a construção do Reino de Deus.
Pode até parecer um pouco difícil entender o que é paz inquieta, quando nos tempos de hoje fala-se tanto em bem-estar pessoal, satisfação pessoal, felicidade pessoal. É tudo muito pessoal e quase nunca se ultrapassa a dimensão do eu. Essa sábia expressão toca na grande ferida da sociedade: o egoísmo que suprime o “nós” em favor do “eu”.
A experiência cristã do “pai-nosso” e do “pão nosso” muda o conceito de que estar em paz é estar sossegado, com todos os problemas resolvidos, sem conflito com ninguém e que seja cada um por si. A verdadeira construção da paz está intimamente ligada à experiência da partilha, do amor ao próximo, da luta profética em favor dos que sofrem.
Lembramos, assim, das figuras bíblicas de Jeremias, Isaías, Amós, João Batista e Jesus que encarnaram a força transformadora da paz inquieta. Viveram grandes conflitos em seu tempo, enfrentaram a trama e a prepotência dos poderosos, mas nunca perderam a paz.
Foi a paz inquieta que motivou os profetas de ontem e de hoje. Dom Hélder Câmara, Irmã Dulce, Madre Teresa de Calcutá, Mahatma Gandhi, Nelson Mandela eram pessoas inundadas de paz, mas dispostas a correr riscos pelos pobres e excluídos. Homens e mulheres profundamente inquietos com a dor do outro. Tantos anônimos chamados à caridade e ao total serviço dos outros, que sabem que o bem de um depende do bem dos outros.
Padre Zezinho explicou a expressão por ele criada dizendo que “paz que não nos deixa inquietos com a dor do outro não é paz”. É a paz de quem tem a coragem de dizer: “Estou bem, mas há muita gente que não está. Agora vou viver por eles”. É a paz de quem parece ter o DNA da alteridade e se não pode transformar o mundo inteiro, transforma o mundo que lhe rodeia, mesmo que seja com pequenos gestos.
Portanto, não nos iludamos com a paz que é pensada pelo mundo. A paz verdadeira passa pelo outro e se faz concreta na comunidade, na sociedade, na coletividade. A corrupção, a injustiça, a desigualdade, a penúria dos inocentes, a cobiça dos culpados, tudo isso nos inquieta. A esperança, o amor, a juventude, as virtudes dos homens de boa vontade, tudo isso nos deixa em paz. Sigamos pelo mundo inquietos, porém em paz.

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