RESSURREIÇÃO E VIDA
“Dá-me de beber uma água viva!” “Eu sou a luz do mundo!” “Eu sou a ressurreição e a vida!” Todos nós, envolvidos na preparação da Páscoa, somos chamados ao novo encontro com Jesus Cristo, nossa Páscoa, nossa esperança. A partir de ângulos diferentes, todos caminhamos para ele, a fim de participarmos com ainda maior intensidade de seu mistério, na graça dos sacramentos da iniciação cristã que recebemos. E nossa Igreja de Belém celebra este tempo especial dando passos na realização de seu Plano de Pastoral, fruto do esforço conjunto, iluminados que fomos pelo Espírito Santo para ser uma Igreja missionária, de portas abertas, dando nossa contribuição para que nossas cidades e nosso tempo se encham da alegria genuína, fruto do mesmo Espírito.
Hoje vamos apenas acompanhar Jesus e seus discípulos a Betânia (Jo 11,1-45), casa do pobre e da amizade, lugar que podemos imaginar como verdadeiro refúgio, onde se encontravam à vontade. Trata-se de Lázaro, um amigo, daqueles que uma expressão popular diz serem mais queridos do que um irmão! O Senhor fica sabendo de sua enfermidade. Onde se encontrava, permaneceu ainda dois dias, viajando apenas no terceiro dia, certamente um detalhe do autor do Quarto Evangelho para referir-se ao dia da Ressurreição de Jesus, cujo fato aqui descrito é prenúncio e sinal. Os laços de amizade levam Jesus a dirigir-se à Judéia, justamente quando o clima de perseguição se acirrava. De longe, sabe o Senhor que Lázaro morreu. Jesus não se mostra como um taumaturgo, mas como amigo e irmão! Para curar e restaurar, há que começar com um relacionamento humano verdadeiro, pelo que temos muito a aprender, para sanar as feridas físicas, emocionais, psicológicas e espirituais, missão de nossa Igreja!
O Evangelho fala dos quilômetros de distância entre Jerusalém e Betânia, e Jesus certamente estava mais distante. Noutro texto evangélico (Lc 24, 13-35), distância percorrida com decepções por onze quilômetros se transforma num verdadeiro salto depois da experiência do Ressuscitado em Emaús! Nossa Grande Belém é bem maior do que Nínive, para critérios antigos, “uma cidade fabulosamente grande, do tamanho de uma caminhada de três dias” (Jn 3,3). Não há distâncias intransponíveis para o zelo da nova Evangelização missionária a que somos chamados, a fim de curar o mundo e as pessoas, reconduzindo-as à vida plena!
É Marta que recebe Jesus, enquanto sua irmã Maria permanece em casa. Uma pequena família, diferenças entre as pessoas, mas ressoa o convite: “O Mestre está aí e te chama”. “Quando Maria ouviu isso, levantou-se depressa e foi ao encontro de Jesus” (Jo 11,28-29). Em voz alta ou ao pé do ouvido, a boa notícia há de percorrer estradas, casas e corações. O problema é quando não levamos o chamado de Jesus, mas nossas pequenas e tão limitadas ideias. Quando a mensagem do Senhor chega, o salto acontece na vida das pessoas. Cuidemo-nos seriamente, para que não sejamos intermediários falsificados!
Nossa meditação vai com Marta, Maria, Discípulos, uma Multidão de pessoas positivamente incomodadas (“Muitos dos judeus viram o que Jesus fizera e creram nele” – Jo 11,45) e outras curiosas, para chegar à entrada do sepulcro. Aqui, uma cena humana e surpreendente: “Jesus chorou” (Jo 11,35). Para nós e nossa Igreja, fica a lição de humanidade, pois não tratamos das dores humanas como exercício profissional, mas com a sensibilidade da caridade e da atenção!
Algumas situações, como um morto quatro dias antes (Jo 11,39), podem levar ao desânimo daqueles que pensam não haver soluções. E com Jesus aprendemos que não é verdade o dito de que só com a morte não há jeito, pois nele e com ele sempre ressoará o “Lázaro, vem para fora” (Jo 11,43)! É hora de ampliar nosso horizonte e descobrir o que existe de mais difícil e desafiador em nossa sociedade, para chegar lá com a Evangelização e a Caridade.
Algum tempo antes desses fatos, Jesus “chamou os doze discípulos e deu-lhes autoridade de expulsar os espíritos impuros e curar toda sorte de males e enfermidades. Curai os doentes, ressuscitai os mortos, purificai os leprosos, expulsai os demônios. De graça recebestes, de graça deveis dar” (Mt 10, 1.8). De lá para cá, a missão da Igreja (Cf. a proposta do Plano Arquidiocesano de Pastoral para “Curar”) é empenhar-se no “anúncio do Evangelho aos homens do nosso tempo, animados pela esperança, mas ao mesmo tempo torturados muitas vezes pelo medo e pela angústia, um serviço prestado à comunidade dos cristãos, bem como a toda a humanidade” (Cf. Evangelii Nuntiandi, 1). O sentido da vida cristã, seu rosto mais reluzente, encontra-se na caridade. “A caridade é a virtude pela qual amamos a Deus sobre todas as coisas por ele mesmo, e ao próximo como a nós mesmos, por amor de Deus” (Cf. Catecismo da Igreja Católica, 1822). Ao mesmo tempo, “quanto mais o homem fizer o bem, mais livre se torna. Não há verdadeira liberdade senão no serviço do bem e da justiça” (Catecismo da Igreja Católica, 1733).
O testemunho profético através da caridade e serviço é a marca inseparável da missão da Igreja de “portas abertas”, em saída ao encontro do outro, e disposta a acolher quem chega, pois, considerando-se que, “quando amado, o pobre é estimado como de alto valor” (Evangelii Gaudium, 168), e isto diferencia a autêntica opção pelos pobres de qualquer ideologia, de qualquer tentativa de utilizar os pobres ao serviço de interesses pessoais ou políticos. Unicamente a partir desta proximidade real e cordial é que podemos acompanhá-los adequadamente no seu caminho de libertação. Só isto tornará possível que “os pobres se sintam, em cada comunidade cristã, como ‘em casa’” (Evangelii Gaudium, 199). Nossa Igreja de Belém quer fomentar o ministério da caridade, reorganizar todas as expressões caritativas presentes na Igreja, implantando pastorais sociais e organismos da missão sociotransformadora na Amazônia, sendo presença luminosa nas causas sociais, como “Igreja em saída”. Não há limites ou ambientes em que a Igreja não possa ou não deva estar presente. “Curar” há de ser uma palavra apaixonante, para que o cuidado com pessoas e situações se multiplique entre nós, pois todos nós, batizados, acreditamos que o Senhor Jesus é Ressurreição e Vida!
Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo de Belém do Pará (PA)