Eudes Sousa presidente da Academia Massapeense de Letras e Artes2

EUDES DE SOUSA

São muitas obras que o leitor tem em mãos, sobre a história da Academia Sobralense de Estudos e Letras: uma história de 100 anos, que virou mito, e, constitui um marco especial em nosso cenário cultural.
Mas o que significa para classe literária e outros estudos, uma Academia quando é sabido que a história das Academias se divide em duas etapas: uma de 1922, e a outra de 1943? E o que vale para o poder público, história como esta de tanto valor cultural? O que ela é, enfim, para a intelectualidade sobralense?
A começar pela história sobre episódios marcantes de um esforço conjunto, orquestrado por diferentes agentes, em momentos distintos de nossa história; mas é, também e principalmente, o registro de uma paixão fulminante, dessas que o tempo não sufoca nem reduz a intensidade, de se criar duas Academias de Letras, a primeira em que se destacou o Clero intelectual Monsenhor Linhares, e sua dedicação indormida para mantê-la em pleno funcionamento.
A Academia Sobralense de Letras de 1922 em terras sobralenses se inicia, na encruzilhada dos tempos modernos no Brasil, e chegou-nos com as limitações características de um tempo de nossa história. E tais limitações foram de diversas ordens. A começar pela urgência do Movimento Modernista em organizar a Semana de Arte Moderna. Historiadores assinalam que já existia bem forte a presença de escritores modernistas no Ceará.
Diante da bem polêmica de expansão do movimento modernista, este artigo, porém, ficaria incompleto se imaginássemos que em 1922 começaria a Semana de Arte Moderna, e precisamente no ano 1924, houve, então no plenário da Academia Brasileira de Letras, numa demonstração eloquente de que nosso maior cenáculo das letras nunca teve maiores preconceitos com os movimentos contrários ao seu reconhecido tradicionalismo.
Graça Aranha, a certa altura, depois de ofender, seriamente, às tradições da Casa de Machado de Assis, de que fora fundador, apesar de não contar, em seu currículo, um livro publicado sequer, gritou: Abaixo a Grécia! Morram todos os helenos! Invocação, esta sim, aparentemente sem nexo, porque a velha Grécia e os seus helenos gloriosos só permaneciam, havia muito, na memória dos que lhe herdamos a civilização superior. Então, Coelho Neto, que era de idade avançada, esquecendo-se, momentaneamente, de certo, que, por trás dos excessos naturais do Modernismo nascente, havia o essencial, isto é, o desejo geral de modernização completa de nossa cultura, revidou: “Mas, eu serei o último heleno e o fogo das paixões não vai destruir a beleza da cultura, porque a inteligência é eterna”.
É preciso observar que, à época da Academia Sobralense de Letras, a especulação filosófica social não vicejava entre nós como em terra nativa. O domínio do darwinismo, do positivismo exercia fascínio nas gerações mais voltadas para a especulação. É bem de ver que não se tratava de um evolucionismo sólido, senão que de forma meramente embrionárias de um pretenso sistema completo. O positivismo parecia mais respeitado pelos seus arautos.
O ecletismo em nossa cultura pronama, de preferência, do vezo de assentir e pugnar por teses na individualidade, sem atentar devidamente para a sua adequação a uma sistema de ideias metodologicamente estruturado numa inequívoca travação lógica. Razão assiste a Sergio Buarque de Holanda quando sustenta que, entre nós a maioria dos homens de grande talento incorre em contradições de que não têm consciência. Não há de se estranhar a sinuosidade na opção propriamente literária e à dispersão no campo das ideias, no de 1922.
É importante sublinhar que não advogamos uma subordinação da literatura à ciência. Apenas referimos a presença, muitas imperceptível, de um embasamento especulativo do culto das letras poder indiretamente interferir em sua criação. Isto porque nós somos de acordo com Kant que, em sua crítica do Juízo, cuida de evitar as dificuldades de uma independência indesejável da arte a uma finalidade que lhe restrinja o campo de atuação. É o sentir também de Goethe, para quem a propósito da beleza “não podem lábios humanos dizer nada mais sublime do que existe”.
Na linguagem de um dos maiores pensadores franceses do nosso século, Henri Bérgson, na encruzilhada dos tempos modernos a mais poderosa voz de conclamação da mística vem da física.
Leonel França, na crise do Mundo Moderno, diz: “Entre os elementos que integram uma cultura e lhe constituem e exprimem a fisionomia própria, há um merecedor, pela sua importância de atenção mais demorada. É a vista da vida, é a concepção do homem e dos seus destinos. “Inesperável de toda civilização, há uma doutrina metafísica, uma sistematização do universo e das relações entre os seres, que lhe alimenta as energias íntimas e lhe anima e ilumina toda a vida interior”.
O homem é, pois, pelo significado, grandeza e amplitude, o problema central da civilização. A cultura vale pela concepção da vida, que a dinamiza e pelo valor do conteúdo humanístico que possui. Na série de gerações sucessivas de uma civilização, cada civilização, se não quer trair a sua destinação, tem o dever de examinar os seus valores, de manter e, sobretudo, de superar em terrenos novos, o patrimônio que lhe foi legado pelas gerações anteriores. Na formulação desta tarefa, está equacionado, de maneira essencial, a história da Academia Sobralense de Estudo e Letras a partir de 1943, como bem diz Francisco Dênis que teve como seu principal articulador pela fundação da ASEL Monsenhor Vicente Martins da Costa, Dr. João Ribeiro Ramos , presidente por 23 anos ininterruptos.
A partir daí, vejo a igreja presente atuando no esforço de formação de duas Academias, a Academia Sobralense de Letras e Academia de Estudos e Letras de que elas são pelas suas características históricas, culturais e morais, um resultado que se caracteriza por uma ordenação de significado de valores e uma organicidade coerente e viva.
Na tese de doutorado, “Os intelectuais da Academia Sobralense de Estudos e Letras- e a invenção da cidade letrada,” do Dr. Francisco Dênis Melo, uma história de 100 anos da Academia Sobralense de Estudo e Letras, depois de 1943, passagens e personagens fundamentais que o leitor tem em mãos, a história da uma história de 100 anos, contada por grande pesquisador maduro, que soube armar a narrativa em estreito diálogo com preciosas fontes documentais, que são a base para qualquer trabalho acadêmico consistente.
Os registros da história da Academia Sobralense de Estudos e Letras, contudo, demonstram que a Academia foi recebida com entusiasmo na cidade. As grandes ideias, aquelas sobre as quais o tempo aplica o selo de legítima aspiração social, jamais morrem. Podem sofrer duros golpes até, podem também parecer sepultas, mas continuam vivas.
Vejo recetemente na história da Academia centenária, o trabalho gigantesco que a Academia realiza para estar presente nos grandes eventos. Vejo, na nossa terra, Sobral, a Academia, na pessoa da presidenta, Chrislene Carvalho dos Santos Pereira Cavalcante, com a inteligência e o dinamismo de sua enorme capacidade de trabalho, fertilizando todas as atividades culturais e morais, bem como do acadêmico e escritor Davi Helder de Vasconcelos, em que na sua obra, palmilha o cotidiano sobralense, varrendo as ruas, galgando os acontecimentos históricos, penetrando os caminhos, estudando os costumes, deste povo que lhe devota amor filial. Quando outras atividades não existirem, bastaria essa, os 100 anos da Academia Sobralense de Estudos e Letras, coroada, para situar na história de Sobral, do Ceará e do Brasil. Parabéns!
EUDES DE SOUSA, Jornalista, crítico literário e presidente da Academia Massapeense de Letras e Artes.

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