O padre da paróquia de minha infância falava com frequência que os pais devem dar bom exemplo aos filhos; e o mesmo devem fazer os adultos em relação a crianças e jovens. Quem ainda está preocupado com isso? É corrente o ditado popular: “as palavras comovem; os exemplos movem”. São Francisco recomendava aos seus frades que fossem pregar o Evangelho pelas ruas, no meio do povo; se necessário, também com palavras. E Santo Agostinho recomendava aos pregadores: aquilo que dizes com tua boca, não desminta a tua vida.
No sermão da montanha, Jesus ensina: vós sois a luz do mundo. Brilhe a vossa luz diante dos homens, para que eles vejam as vossas boas obras e glorifiquem o Pai que está nos céus (cf. Mt 5,14-16). Esse ensinamento não diz respeito apenas a alguma boa ação praticada, mas à vida inteira do discípulo e do cristão, que deve irradiar a luz recebida de Cristo e do Evangelho do reino de Deus.
No Batismo, foi-nos entregue uma vela acesa, normalmente, no círio pascal, que lembra Jesus ressuscitado, luz do mundo. E o celebrante recomendou aos pais e padrinhos que ajudassem o neobatizado a caminhar na vida como filho da luz. Quem foi batizado fez a renúncia a Satanás, o “príncipe das trevas”, e a todas as suas seduções e suas obras, que resumimos com uma palavra: o pecado. Recebemos a luz da fé, pela graça do Espírito Santo, para irradiarmos ao longo de toda a vida a luz de Cristo através do nosso viver. Ele é a luz do mundo: “eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará nas trevas, mas terá a luz da vida” (cf. Jo 8,12).
Com razão, por vezes se pergunta: que diferença faz entre ser cristão e não o ser? Se o cristão vive como os demais, que não são cristãos? Se o seu comportamento não se distingue em nada do comportamento daqueles que não são cristãos? Pior ainda, quando um cristão pratica o mal, leva vida desonesta, trata mal as pessoas e dá todo tipo de mau exemplo. Isso equivaleria a mergulhar novamente nas trevas, cultivando todo tipo de ações que São Paulo qualifica como “obras das trevas” (cf. Rm 13,12).
No sermão da montanha, Jesus também ensina: “vós sois o sal da terra. Mas se o sal se tornar insosso, com que salgaremos? Ele não servirá para mais nada do que ser jogado fora e pisado pelos homens” (cf. Mt 5,13). Quando a vida do cristão não faz mais nenhuma diferença e ele vive como quem nunca conheceu a Cristo, acontece isso mesmo: é como o sal, que perdeu o seu vigor e já não tem mais efeito.
Menos mal, que há uma solução e a vida do cristão “insosso” pode mudar e voltar a ter o sabor de Cristo novamente. E a luz apagada, que virou trevas, pode voltar a brilhar. Nesse caso, faz-se necessário um processo de profunda conversão e renovada busca de Deus e de seus caminhos. A oração, a leitura e escuta atenta da palavra de Deus, o arrependimento e a busca do perdão de Deus podem restituir novo sabor e nova luz a quem busca a Deus sinceramente. Ele não rejeita um coração contrito e humilde, que se arrepende e pede perdão.
O tema da luz e seu simbolismo é muito frequente na Bíblia. O profeta Isaías, falando a um povo que se queixava por se sentir abandonado por Deus, por não ver seus rogos atendidos e porque sua vida parecia ter mergulhado nas trevas. E o profeta exorta: repartam o pão com o faminto, acolham em sua casa os pobres e andarilhos, vistam quem está sem roupa, deixem de lado os instrumentos de opressão, os hábitos soberbos e a linguagem maldosa; acolham o indigente, prestem socorro ao necessitado. Então a sua luz brilhará e sua vida obscura será como o meio-dia. E Deus os atenderá sem demora (cf. Is 58,7-10). Em poucas palavras, Isaías recomenda o mesmo que Paulo: abandonem as obras das trevas e revistam-se da luz de Cristo (cf. Rm 13,12-14).
As palavras do profeta também estão presentes na passagem do Evangelho, onde Jesus recomenda a prática das obras de misericórdia, sem as quais ninguém participará da luz do paraíso e da glória de Deus (cf. Mt 25,31-46). Essa passagem retrata a cena do grande julgamento final. A prática das boas obras fará toda diferença: “vinde, benditos de meu Pai, tomai posse do Reino que meu Pai vos preparou desde a criação do mundo; pois eu estava com fome e me destes de comer; eu estava com sede e me destes de beber…” (Mt 25,34-35).
O motivo supremo pelo qual devemos irradiar a luz de Cristo em nossa vida é este: para que tenhamos parte na luz de Deus, na vida eterna. Quem não o faz continua nas trevas.
Por Dom Odilo Pedro Scherer – Arcebispo da Arquidiocese de São Paulo

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