Durante anos transitando pela CE-362 (Sobral-Massapê), a caminho da Rádio Ressurreição do Mons. Sadoc de Araújo, costumava observar o espesso matagal que margeava a estrada. Independentemente de, às vezes, verdinho; outras, seco e esturricado, a existência dele ali levava-me a intuir algo que beirava o verdadeiro, fazendo-me concluir que “daquele mato poderia sair alguma coisa benéfica”. Enfim, acredito que nada está à toa na natureza. Além disso, emergia algo como um apelo: “Estuda-me, desvenda-me, pois aqui tem muita cura.”
Essa intuição cada vez mais se aproximava de espelhar algo real. Isso acontecia à medida que eu tomava ciência do poder curativo que emana dos reinos animal, vegetal e mineral. E, nesse enfoque, destaque para a imensa riqueza medicinal da nossa flora, que já foi constatada cientificamente e documentada no âmbito da nossa caatinga.
Por falar nisso, neste domingo (21 de maio), no Ceará, será comemorado o Dia Estadual das Plantas Medicinais, numa justa e merecida homenagem ao Professor Dr. Francisco José de Abreu Matos (foto). O cientista nasceu em Fortaleza (CE), no dia 21 de maio de 1924, lá viveu e trabalhou a vida inteira, onde também faleceu aos 84 anos, em 22 de dezembro de 2008.
Segundo a Revista do Farmacêutico nº 121, de 2015, o afamado cientista Professor Dr. Francisco José Abreu Matos era farmacêutico-químico, formado pela Faculdade de Farmácia do Ceará, em 1945. Foi um dos fundadores da Universidade Federal do Ceará (UFC). Era doutor em Farmacognosia, livre-docente e professor emérito. Aposentou-se em 1980, depois de 37 anos de serviço prestado à UFC, mas a sua ideia obsessiva de construir algo relacionado a plantas que pudesse melhorar a qualidade de vida das pessoas não o deixou parar de trabalhar.
Dr. Abreu Matos descende da família (Matos), que conta com quatro gerações dedicadas à Farmacologia e às Plantas Medicinais. Seu bisavô (Francisco José de Mattos) foi o criador das famosas “Pílulas Purgativas do Cirurgião Mattos”, popularmente conhecida pelos cearenses como “Piula do Mato”. A fabricação dessas “píulas” teve início em 1846, quando Dr. Mattos residia em Quixeramobim (CE). Conforme a família, elas eram feitas à base de duas plantas regionais: “cabacinha” (Luffa operculata) com “batata-de-purga” (Convolvulus operculata). Segundo a Revista, o marco histórico do desenvolvimento da Fitoterapia no estado do Ceará foi a criação das Farmácias Vivas, um programa de assistência social farmacêutica baseado no emprego científico de plantas medicinais e fitoterápicos, idealizado pelo professor Francisco José de Abreu Matos (F. J. A. Matos), em 1983, e organizado sob a influência da OMS.
Na época, sabia-se que estavam fora do sistema de atenção primária de saúde 20 milhões de nordestinos que tinham como única opção de tratamento, de si mesmo e da família, as plantas medicinais disponíveis no meio onde viviam. Então, Dr. Abreu Matos indagou:

I. Quais são as plantas usadas na medicina popular do nordeste?
II. Como é possível selecionar em quais delas a atividade curativa atribuída pelo povo realmente existe e quais podem ser usadas sem risco para a saúde?
III. Como fazer para que a planta selecionada segundo os critérios de eficácia e segurança possa chegar ao usuário?
Para solucionar o problema, por meio do Programa Farmácias Vivas, o professor F. J. A. Matos propôs uma metodologia que pudesse levar às comunidades dois níveis de atendimento: preparação de fitoterápicos, prescrição e dispensação na rede pública de saúde, e orientação sobre o uso correto de plantas medicinais e preparação de remédios caseiros, com garantia de eficácia e segurança, baseado em hortos medicinais constituídos de plantas medicinais com certificação botânica.
A partir de 1997, as Farmácias Vivas foram institucionalizadas pela Secretaria da Saúde do Estado do Ceará (Sesa), por meio do Programa Estadual de Fitoterapia, e, no ano de 2007, foi criado o Núcleo de Fitoterápicos da Coordenadoria de Assistência Farmacêutica (NUFITO/COASF).
Em 7 de outubro de 1999, foi promulgada a Lei Estadual Nº 12.951, que dispõe sobre a implantação da Fitoterapia em Saúde Pública no Estado do Ceará, por meio da implantação de unidades Farmácias Vivas. As disposições do regulamento técnico dessa lei, Decreto Nº 30016, de 30 de dezembro de 2009, se aplicam desde o cultivo a preparação de fitoterápicos e sua dispensação no âmbito do Sistema Público de Saúde, em consonância com a Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos (Decreto nº 5.813, de 22 de junho de 2006).
Até pouco tempo, mais de cem municípios cearenses e até de outros estados contavam com as Farmácias Vivas do Dr. Abreu Matos. Lamentavelmente, muitos deles oferecem atualmente apenas de forma parcial esse relevante serviço à população mais pobre; outros, nem isso mais oferecem. EM TEMPO: O que ocasionou o fim da Farmácia Viva de Sobral? Clamoroso e indesculpável desrespeito ao trabalho e à memória do Dr. Abreu Matos, bem como àqueles que poderiam usufruir daquilo que a natureza nos oferece de graça!!!

 

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