Jogando conversa fora

Pensando que eu não tinha conhecimento do registro de um encontro de três gigantes da nossa Cultura e da nossa Religiosidade, há poucos dias um internauta amigo enviou-me uma fotografia “histórica e rara”, segundo ele.
Durante algum tempo essa foto, que representa a perspicácia de quem a fez, circulou com muita frequência pelas redes sociais. Foi contemplada, analisada, copiada, editada e comentada à exaustão.
O nosso companheiro Marcildo Brito (Repórter Fotográfico) foi muito feliz ao flagrar e registrar a singularidade e a espontaneidade do encontro desses três notáveis da Igreja Católica em Sobral. Também chamou atenção aquela vontade quase incontrolável de postar um comentário, que tomava conta imediatamente de todos que viam a fotografia dos padres Osvaldo Chaves (21.10.1923 – 13.02.2020), João Batista Frota e Sadoc de Araújo, ambos ainda entre nós, “jogando conversa fora”.
E foi grande a quantidade de pessoas que deixou opinião sobre o trio de batina. E mais: todos os comentaristas enalteceram aquele bate-papo entre a sabedoria, a história e a experiência.
Até mesmo pessoas que costumam “jogar conversa fora”, falando mal da Igreja Católica, principalmente de alguns maus sacerdotes que também existem, renderam-se diante do que fez, do que faz e do que representa esse trio para as pessoas, independentemente da religião que professem. Curvaram-se, desse modo, diante do fato de que o número dos bons é bem maior. Só falta ser mais divulgado.
Portanto, que os amigos fotógrafos busquem mais flagras interessantes como o mostrado acima. Mas que sejam de homens do quilate de Pe. Osvaldo Chaves, Pe. João B. Frota e Pe. Sadoc de Araújo, mesmo que estejam “jogando conversa fora”.
Quem sabe, alguém de bom senso recolhe essa conversa jogada fora, assimila-a e, de sobra, adquire sabedoria e experiência para fazer a história da sua vida e ajudar na constrição da vida dos seus semelhantes.

 

JOSÉ SOARES DA SILVA (ZÉ CAFÉ)

Há doze anos, exatamente num domingo, quase sempre o dia do descanso do tocador, ele foi convidado a folgar de vez. Naquele dia, o forró pé-de-serra do norte cearense sofreu mais uma grande perda: morreu em Sobral o veterano sanfoneiro José Soares da Silva, popularmente conhecido por ZÉ CAFÉ. Foi juntar-se à sua antiga turma: seu compadre Gerardo Ferreira, Pedro Lavandeira, Zequinha Freitas, Gregório, Artêmio, Palha Braba, Darley Arruda e muitos outros. José Soares da Silva nasceu em Sobral (CE), em 29 de agosto de 1927, sendo seus pais Aristides Soares e Silva e Maria Leandro. O apelido já veio da infância por causa de sua cor. Logo cedo, aos 13 anos, começou a trabalhar para ajudar a família, conciliando isso com os estudos, razão pela qual chegou apenas à antiga 4ª Série Primária.
Seu primeiro emprego foi na Fábrica de Fiação e Tecido Sobral Ernesto Saboia & Cia., onde ingressou em 04 de maio de 1942, com carteira assinada pelo Dr. José Maria Mont’Alverne. Lá trabalhou inicialmente como carreteleiro, tendo também exercido a função ajudante de escritório. Deixou a Fábrica em 17 de maio de 1946.
Por volta de 1945/46 conheceu dona Maria Ferreira, que se tornou sua esposa. Eram irmãos dela os músicos da família Ferreira (Gerardo, Vicente, Antônio, Chico Carlos e Zé Ferreira), todos tocadores de sanfona. Foi dessa convivência com os cunhados, principalmente com Gerardo Ferreira, que Zé Café aprendeu a tocar na sanfona de botão. Empunhou-a por muitos anos em forrós memoráveis.
Na década de 1950 passou a tocar em festas, boates, shows de auditório nas rádios Iracema (Zé Maria Soares) e Educadora (Marcos da Cruz). Além disso, também trabalhava como carroceiro, transportando água juntamente com seu pai, Sr. Aristides. No final dos anos 50 criou seu grupo musical, do qual participaram Virgílio, Mozart, Manoel Cossias, Zé Gaspar, Raimundo Reis, dentre outros. Por essa época se integraram ao conjunto de Zé Café os cantores Darley e Palha Braba.
Nos anos 60 e 70, com o grupo mais eclético e renovado, passou a se dedicar somente à música. Por essa época deixou definitivamente sua marca registrada na história política de Sobral. Nas campanhas eleitorais era a famosa charanga de Zé Café que animava candidatos e partidários, contando sempre com a companhia de Darley, além de outros já falecidos, como Palha Braba, Zequinha Freitas, Raimundo Sena, Gregório, Silvestre.
Nessas campanhas, Zé Café e seus músicos travaram verdadeiras batalhas musicais, tendo como principal concorrente o grupo de Gerardo Ferreira. Mas a disputa era somente no campo musical, ficando as amizades totalmente preservadas entre os cunhados e os demais artistas.
Chegando a década de 1980, Zé Café tornou-se funcionário público estadual na Secretaria de Educação. Passou, então, a trabalhar menos na música, deixando-a por completo nos anos 90 e alguns anos depois conseguiu aposentou-se. A partir daí, reservou-se mais no seu lar, onde recebia o carinho e a gratidão de toda a família que o amava muito e dos amigos que o admiravam e o respeitavam. A razão era muitos simples: Zé Café foi um exemplo de homem bom, que só viveu para fazer o bem e para alegrar a todos.
No final da vida, abatido pelo peso dos anos e pela saúde debilitada, José Soares da Silva (ZÉ CAFÉ) continuava repassando o mesmo otimismo e a mesma alegria que o caracterizaram durante toda a vida. E o mais importante: Sentia-se um homem feliz, cônscio de que cumprira fielmente seu dever para com a família, para com amigos e para com o Pai do Céu, para o Qual voltava depois uma bela passagem pela terra.
O sanfoneiro José Soares da Silva (ZÉ CAFÉ) faleceu em Sobral (CE), aos 84 anos, no dia 8 de abril de 2012, sendo sepultado no cemitério São Francisco, no bairro do Junco, nesta cidade.

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